Algumas vezes, com amigos, apontávamos lugares nos quais gostaríamos de morar fora da Ilha do Governador. Sempre citava dois: Morro da Conceição e Praça São Salvador. Minhas escolhas sempre foram pautadas na vida cultural da região.
Morar a partir do centro da cidade, Glória, Catete e seguindo para a Zona Sul sempre foi desejo boa parte de meus amigos, principalmente os solteiros, sem filhos, artistas e aqueles ligados a uma vida mais alternativa. Adoramos a Ilha, mas ela fica longe de tudo, e a distância aumenta com os engarrafamentos e a violência. Quem já foi ao Aterro do Flamengo num domingo de sol sabe o que estou falando. Apresentações artísticas nas ruas, feiras, gente praticando esportes, uma infinidade de coisas para fazer e gratuitas. Sem falar nos restaurantes, teatros e centros culturais.
Diante dessa suposta bolha imobiliária que está se formando no Rio, se mudar para esses lugares ficou mais complicado. Conheço gente que paga mil reais de aluguel em uma quitinete. O custo de vida está alto e os salários baixos, fazendo com que jovens estiquem a estadia na casa dos pais.
Mas os 30 são os novos 20. As pessoas estão casando mais tarde, tendo filhos mais tarde e conseguindo estabilizar a vida financeira mais tarde. Também estão vivendo mais. Sou exemplo desta nova geração e não vejo problema nesta nova configuração. Sempre achei absurda a ideia de alguém com dezesseis, dezessete anos ser pressionado para escolher a profissão que vai seguir pelo resto da vida. São adolescentes de dezenove que estão portando metralhadoras ponto cinquenta no Iraque. Responsabilidades e decisões importantes demais para serem tomadas tão cedo.
Ter mais tempo para amadurecer pode nos tornar adultos melhores. Ter mais tempo para aprimorar nosso desenvolvimento intelectual pode nos fazer pessoas mais críticas, evitando com que tomemos decisões equivocadas. Obviamente o exército não vai mudar a idade de alistamento por causa disso, mas o que quero dizer é que pelo menos, na nossa vida pessoal e profissional, podemos decidir caminhos que nos façam mais felizes, como trabalhar com o que realmente gostamos e casar não por medo de ficar sozinho, mas porque encontramos alguém que vale a pena.
Rua no Morro da Conceição. RB1 ao fundo. |
A primeira vez que escrevi aqui sobre o Morro da Conceição foi em 2008. Um dos marcos da ocupação original da cidade, junto com o Morro do Castelo, de São Bento e Santo Antônio. Calçamento de paralelepípedo, antigos sobrados, crianças brincado nas ruas, vizinhos conversando na porta de casa e botequins mantendo a goela da rapaziada lubrificada até altas horas. E tudo isso a cinco minutos de caminhada da Rio Branco e da Presidente Vargas. Escondido atrás dos altos prédios do Centro, está ganhando visibilidade agora, diante das obras do Porto Maravilha, e já é comum ver grupos de visitantes e turistas andando por lá com máquinas fotográficas clicando detalhes da arquitetura e de um estilo de vida dos moradores que parece parado no tempo.
Apesar dos preços abusivos cobrados nos imóveis do Rio, o Morro da Conceição continua praticando preços honestos e abaixo do mercado, e suas casas e apartamentos não são anunciados em classificados e imobiliárias. Quando tem alguma coisa vaga, o proprietário negocia por indicação, com o objetivo de manter a comunidade entre amigos, mesmo que ele perca dinheiro desta forma. Estou dividindo uma casa com um amigo na qual o dono poderia cobrar o dobro pelo aluguel, talvez até mais.
O lugar é encantador e estou gostando muito. Um final de semana comum: festa no Largo da Santinha, em frente à fortaleza, em homenagem à Nossa Senhora da Conceição, e cinema na pracinha. Um pouco mais abaixo, jazz na Pedra do Sal. Ateliês com portas abertas, vizinhos e visitantes dividindo mesas dos botequins. Crianças nas ruas.
Também é comum motoristas oferecerem carona para aqueles que estão subindo a pé a ladeira. Comentei com um amigo que uma pessoa que nunca tinha me visto me ofereceu carona e descobri que este é um hábito comum, inclusive de madrugada.
Apesar da loucura que está transformando a região portuária, com implosões e obras para todo o lado, o Morro da Conceição mantém a calma encontrada em ruas do subúrbio e nas cidades do interior.
Tenho rodado pela região, andando pela Gamboa e Morro do Pinto, descobrindo que existe muita vida por trás dos altos prédios do Centro da Cidade.
Nasci e me criei nesse lugar!
ResponderExcluirFiquei até os 15 anos e depois tive que mudar!
Mas é meu lugar de coração, apesar de gostar da Ilha!
Boa reportagem!
Obrigado Taisa. O Morro da Conceição é encantador, mas também gosto muito da Ilha, local onde nasci e fui criado.
ExcluirMorei aí por dois anos, foi formidável. Quanto as caronas, somente me ofereceram uma vez e foi o Emeraldo. Mas, confesso que subia pouco pela Major Daemon, principal subida para automóveis.
ResponderExcluirSó eu fiquei com um sentimento de nostalgia por vc ter saido da Ilha?
ResponderExcluirAh Sandra, não mudou muita coisa, né?
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